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                                                                                                   Foto de Pai Antão
GRATA
...
(te digo)
olhava aquelas mãos
sábias
a manobrar a enxada
com a mesma primitiva alegria
com que sinto o primeiro perfume do Verão
assim me lembro do ritual da rega
nas cinzas do dia
uma oração congénita de sabedoria ancestral
dorida e crente
o perfume da terra calada
cansada de se dar ao sol
a sorver a ilusão da chuva
o vestido de algodão níveo
sobre o corpo tenro
e o sorriso trigueiro a comungar
com os pés maculados
a matéria primordial
a tardinha quente a soltar um anjo doce
morno | interior | livre
e a vida a surgir da quimera
de mãos calejadas

nem o silêncio
se compara à música de uma enxada
a rasgar auxílio à terra pedinte
o hino da labuta
- intimo -
 a terra grata
- tocada -

(arrepio-me
!
não quero nem falar dos frutos)
descalça e bravia
sempre o soube
assim será a liberdade:
terá o gosto da conquista e a humildade de um São Francisco






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